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A Arte de Apresentar o Mistério Trinitário

9,00 €
Com IVA

Imagem, Eucologia e Simbólica

Autor: Tiago Fonseca

Tamanho:148X210mm

N.º de páginas: 200

ISBN 978-989-9081-59-8

1.ª edição: maio de 2023

Coleção: Hodie – 12

Excerto e Índice »

A profissão de um Deus que é Pai, Filho e Espírito Santo é o mistério central da fé e da vida da Igreja. Ao longo dos séculos, a complexidade e a densidade do dogma da Santíssima Trindade constituiu um desafio à linguagem teológico-litúrgica que encontrou na arte um meio eloquente para se expressar. 

Procurou-se desenvolver o modo como este mistério inefável foi representado na arte litúrgica mediante a imagem, a eucologia e a simbólica. Expõe-se uma breve contextualização da evolução e explicitação do dogma da Santíssima Trindade; apresenta-se a relação entre a Trindade e a liturgia, tendo em conta os textos eucológicos, ritos, gestos e símbolos litúrgicos; e identificam-se os diversos modelos de representação trinitária a partir de imagens, esculturas, pinturas, manuscritos e ícones. Por meio de uma leitura hermenêutica destas representações, vislumbra-se a intrínseca relação entre a lex credendi que é, ao mesmo tempo, lex orandi.

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Introdução

A Igreja vive enraizada no mistério da Santíssima Trindade. Este dogma do Deus uno e trino é estruturante e, ao mesmo tempo, complexo. A sua compreensão e explicitação ao longo dos séculos foi tendo repercussões concretas, nomeadamente na composição dos textos litúrgicos e, desde muito cedo, na arte cristã.

Entrar no âmago deste dogma significa adentrar numa relação hipostática entre o Amante, o Amado e o Amor, relação à qual só temos acesso porque o próprio Deus toma a iniciativa de se revelar e plenamente o faz em Jesus Cristo, rosto visível do Pai.

Escolhemos como tema desta investigação a arte de apresentar o mistério trinitário com o objetivo de aprofundar aquele que é o núcleo da fé e do culto da Igreja, tendo em conta a dimensão simbólica e iconográfica. Contudo, a confissão explícita de um Deus uno e trino aparece frequentemente como irrelevante ou simplesmente ritual na vida dos cristãos, visível por exemplo na escassez de representações trinitárias na contemporaneidade.

A representação do mistério trinitário de Deus concentra duas dimensões principais. Por um lado, os cristãos procuraram pedagogicamente desenvolver uma teologia da imagem, onde os conteúdos da fé rezada foram apologeticamente materializados e custodiados numa Tradição viva e verdadeira. Por outro lado, a representação do Deus Trindade corresponde ao apelo interior do ser humano à transcendência: “é a tua face que eu procuro, Senhor” (Sl 27, 8). Recuperando a perspetiva de Romano Guardini, a representação do divino quer ser “reflexo de beleza do Vero, ‘splendor Veritatis’”[1].

Importa afirmar que a representação trinitária não corresponde a uma reprodução material dos mistérios divinos. Santo Anselmo de Cantuária lembra-nos que Deus é “aquilo maior do que o qual nada pode ser pensado”[2]. Do mesmo modo afirma Karl Rhaner: Deus está sempre “para lá de toda a imaginação e de toda a figura”[3].

Representar a Trindade no contexto artístico-litúrgico não pretende circunscrever Deus à materialidade. Na verdade, constitui uma anamnésis da história da salvação, onde o nosso olhar e o olhar de Deus se cruzam numa esperança que a fé alimenta e que só o amor consumará.

O texto litúrgico, consequência de uma teologia vivente, dá espaço a uma representação cuja linguagem da arte parece ser a única adequada quando falamos do mistério de Deus. A liturgia apresenta-se assim como espaço teológico no qual a Trindade é objeto, princípio e fim. Desde o início do cristianismo que o dogma trinitário ocupou um lugar central nos tratados teológicos, litúrgicos e escritos conciliares. A complexidade do mesmo deparou-se com o limite da linguagem. Consequência desta exigência, a arte da representação constituiu uma ferramenta eloquente enquanto expressão do indizível. De facto, uma imagem vale mais que mil palavras[4].

O dogma trinitário é uma busca constante na compreensão do Evangelho, uma construção que espelha diversos contextos, assim como vastas interpretações teológicas. Neste sentido, a representação da Santíssima Trindade acontece num contexto litúrgico em permanente evolução. Desde os fundamentos bíblicos às mais elevadas interpretações teológicas, a representação trinitária fez-se presente. A regra de fé, mesmo antes da formalização de um Credo, começou por ser tangível na imagem, à qual o acontecimento da encarnação do Verbo dá sentido e legitimidade.

Iniciaremos este estudo com uma breve apresentação do dogma da Santíssima Trindade, pois da conceção que temos de Deus parte toda a representação trinitária. A abrangência do tema exige que nos detenhamos apenas nos principais desenvolvimentos doutrinais: os fundamentos bíblicos, patrísticos e teológicos que vamos apresentar no primeiro capítulo.

As imagens trinitárias da Sagrada Escritura são o primeiro suporte cujos elementos irão permanecer para sempre: a aparição a Adão (Cf. Gn 3, 8-10), a visão de Abraão (Cf. Gn 18), a sarça ardente (Cf. Ex 3), a coluna de nuvem (Cf. Ex 13, 21), o Monte Sinai (Cf. Ex 19), a aparição a Moisés (Cf. Ex 33), a visão de Daniel (Cf. Dn 7, 9. 13-14), assim como a Transfiguração (Cf. Mt 17, 1), o Batismo (Cf. Lc 3, 21) e o acontecimento da Cruz (Cf. Jo 19, 28). A leitura prefigurativa dos Padres da Igreja permitirá o desenvolvimento de uma linguagem simbólica e litúrgica que progressivamente encontrará lugar na arte.

A confissão trinitária desenvolve-se singularmente desde os primeiros tempos na liturgia da Igreja. Por isso, o segundo capítulo deste trabalho será dedicado à dimensão trinitária da liturgia, atendendo também à sua relação com a arte. Cada ato litúrgico começa e termina com uma fórmula trinitária. Esta relação intrínseca é fundamental para a passagem à representação daquilo que é a lex orandi, lex credendi.

No terceiro capítulo iremos apresentar uma hermenêutica dos diversos modelos simbólicos e iconográficos da Trindade, tendo em consideração também os desenvolvimentos contemporâneos das representações trinitárias.

Depressa os símbolos darão lugar a uma representação iconográfica que se mostrará cada vez mais desafiante e complexa, todavia, mais compreensível ao povo. A iconografia trinitária procurará traduzir vários aspetos teológicos, como o equilíbrio entre a unidade e a distinção, a comunhão trinitária e as missões divinas. Desenvolvem-se, desta forma, os vários modelos iconográficos que iremos explorar. Note-se que a representação da Santíssima Trindade pode ser apresentada de forma indireta representando, portanto, um acontecimento bíblico como uma teofania onde a Trindade se faz presente enquanto motivo secundário (por exemplo, o Batismo de Jesus); ou de forma direta, tendo como objetivo a representação das três Pessoas divinas, sem um contexto bíblico particular. Esta última é essencialmente o objeto desta nossa investigação.

Neste itinerário pela presença trinitária na arte litúrgica, iremos ilustrar o caminho desenvolvido em vários séculos de representação eucológica, simbólica e iconográfica. Torna-se relevante apresentar também uma visão daquilo que diz respeito ao presente e ao futuro. À luz da teologia atual, qual a pertinência da representação trinitária? Que lugar ocupa na liturgia da Igreja?

Mais do que apresentar uma resposta definitiva a estas ou outras questões, queremos com esta reflexão suscitar a curiosidade e o permanente empenho para o imenso e valioso mundo da representação trinitária, num tempo em que os símbolos e as imagens parecem ter perdido o seu poder de ação. Uma teologia que esquece a imagem corre o risco de se tornar um simples e vazio conceito racional, desencarnado e incapaz de dar espaço ao mistério. Sabiamente nos lembra o grande teólogo K. Rahner: “Deus e o que se pensa com Ele só pode ser compreendido quando, com admiração interior, se deixa ir a própria compreensão conceptual, deixando-a cair no mistério inefável e sagrado, como aquilo que está próximo de nós e nos contém amorosamente”[5].



[1]       Romano Guardini, O Espírito da Liturgia, 2ª Ed. (Fátima: Secretariado Nacional de Liturgia, 2017), 69.

[2]      Anselmo de Cantuária, Proslogion, II, PL 158, 228.

[3]      Karl Rahner, em Alexandre Palma, A Trindade é um mistério (Prior Velho: Paulinas, 2014), 94.

[4]      Sentença da autoria do filósofo chinês Confúcio.

[5]      Karl Rahner, Schriften zur Theologie, Vol. XV (Einsiedeln-Zürich-Köln: Benziger Verlag, 1954-1984), 115.

AAMT

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